Na cozinha do apartamento da Matilde.
Matilde: Eu estive pensando, Kekekê.
Kekekê: *fazendo bolinhos de chuva*
Matilde: O escritor é uma profissão de mentiroso!
Kekekê: Por que diz isso?
Matilde: Simples. Porque nem todos eles vão para a área da ficção!
Kekekê: É mais divertido escrever, algo que não seja relacionado à realidade. Coisas de escritor, nem eu mesmo entendi o que quis dizer com isso.
Matilde: Vai deixar queimar os bolinhos de chuva, de novo?
Kekekê: Lógico que não! É uma questão de honra.
Matilde: Ah.
Kekekê: Que desânimo! Pensei que gostasse dos meus bolinhos de chuva.
Matilde: E eu gosto! Mas estou pensando nos escritores.
Kekekê: Em algum escritor em particular?
Matilde: Oh, eu estava só pensando no geral, mesmo. Nenhum nome me vem na cabeça.
Kekekê: Ah. Isso é o telefone tocando?
Matilde: É do vizinho, Kekekê.
Kekekê: Nossa. Que toque de telefone alto…
Matilde: Mas é estranho.
Kekekê: O quê é estranho?
Matilde: Agora que você falou, eu não tenho nenhum vizinho.
Kekekê: Mas o telefone é próximo!
[Matilde coloca o ouvido na parede.]~
Matilde: Que coisa estranha!
Kekekê: Os meus bolinhos de chuva ficarão assustados!
Matilde: Até eu estou ficando assustada. Que celular tem bateria para ficar ligado, em um apartamento vazio há tanto tempo?
Kekekê: Ah! Os tijolões resistentes. Dizem que é até material do escudo de um herói.
Matilde: Mas essa linha já saiu de uso. O celular parou.
Kekekê: Agora você pode desencostar o ouvido da parede!
Matilde: É verdade! [vai se sentar na cadeira]
Kekekê: Quase pronto para ir ao forno!
Matilde: Escritores dizem isso sempre.
Kekekê: Escritores cozinheiros de enredo, ou cozinheiros de comida de verdade?
Matilde: Ambos. Quero dizer, isso significaria que há mais escritores do que pensamos!
Kekekê: Eu não penso em nenhum número, na verdade. Quando penso na quantidade de escritores, quero dizer.
Matilde: E quem disse que estou pensando em um número específico?
Kekekê: Realmente, ninguém disse nada. Não há ninguém aqui, além de nós. A não ser que os móveis comecem a falar!
Matilde: Você deveria tomar cuidado, com as coisas que você assiste. É um duende muito influenciável.
Kekekê: Não seja boba, Matilde. Nem tenho rede social.
Matilde: O quê é sensato da sua parte.
Kekekê: É uma palavra engraçada, sensato.
Matilde: Não entendi o porquê. O que faz parecer uma palavra engraçada?
Kekekê: Me lembra nome de tempero.
Matilde: Que ligação peculiar.
Kekekê: E peculiar parece um nome de molho!
Matilde: Certo, Kekekê. Está precisando de umas férias. Urgentes. Que tal nós irmos ao SPA, da minha irmã Martha?
Kekekê: Não quero. Se não, vai queimar os bolinhos de chuva!
— Sim. Eu usei a mesma piada duas vezes. Estou precisando inovar. E estou parecendo ranzinza, enquanto escrevo dessa forma, Deve ser o sono.